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O Barbeiro de Cedilha

A barba na óptica do utilizador

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Barbearia Tinoco

na óptica do utilizador, 10.10.23

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A Barbearia Tinoco é referida no almanaque de 1930 como propriedade de Manuel Fernandes Tinoco, na atual localização na Rua Sá da Bandeira 13.

É uma barbearia extraordinária cuja decoração a inclui no património da cidade do Porto. De admirar os lavatórios em mármore, o chão revestido com mosaicos em leque, as cadeiras em ferro e os enormes espelhos, num conjunto com forte inspiração Art Déco.

Temos de ter especial atenção ao maravilhoso aquecedor de toalhas a vapor e aos balcões em mármore em frente de cada cadeira. Estas preciosidades serviam para pousar os tabuleiros com os lanches que se serviam aos clientes e que eram fornecidos pelo café ali ao lado.  

O projeto é da autoria dos arquitetos Manuel Marques e José Peneda, sendo a barbearia inaugurada em 1929, embora tenha sido registada apenas no ano seguinte.

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Como curiosidade referimos que na sobreloja funcionava um calista, com a respetiva sala de espera. Este gabinete oferecia uma enorme privacidade ao cliente mais abastado que desejava que ninguém suspeitasse que tinha calos.

Foi uma das primeiras barbearias da cidade do Porto a empregar mulheres barbeiras.

Neste momento a equipa é perfeita, amável, simpática, eficiente, muito disponível e é bom saber que um dos seus elementos usa Birkenstock.

De zero a dez, a Barbearia Tinoco merece francamente um nove.   

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As Birkenstock

na óptica do utilizador, 10.10.23

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Amadas ou odiadas, as Birkenstock já provaram que pertencem ao exigente segmento de luxo. Seja por ‘portas travessas’ ou por uma iminente aquisição.

Transcreva-se quem sabe:

“A fusão das sandálias Birkenstock com a icónica Birkin da Hermès valoriza a marca alemã, mas esta aproximação  às marcas de moda de luxo não é de agora. Desde o início da década passada que vários designers têm pegado nas sandálias da discórdia para lhes darem o seu cunho pessoal – em 2020 foi a vez da Maison Valentino, por exemplo. O que neste momento põe a Birkenstock no mapa do luxo são dois acontecimentos distintos, mas que coincidem no tempo. Na mesma semana, em fevereiro, é apresentada a Birkinstock (o ‘i’ em vez do ‘e’ não é gralha) e o fundo de investimento do grupo LVMH está a negociar a compra da marca alemã.”

Alheio a isto não será o protagonismo do calçado confortável durante o confinamento, o que abre uma janela de oportunidade para marcas como a Birkenstock criarem modelos que, sendo confortáveis, tenham a estética e a aura aspiracional dos produtos de luxo. Não é seguindo este raciocínio, porém, que um coletivo de artistas-ativistas decide criar umas Birkenstock feitas com a pele das carteiras Birkin, da Hermès, à revelia de ambas as marcas e capitalizando a semelhança fonética. O polémico coletivo MSCHF, de Brooklyn (Nova Iorque), pega em duas referências de moda opostas e cria uma coleção com base nas sandálias Arizona (as de duas tiras largas, associadas aos ditos ingleses), que pretende dessacralizar o modelo de carteira criado para a atriz Jane Birkin. Que, a propósito, é a carteira (ou mala) mais cara alguma vez vendida em leilão.

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O coletivo de artistas e criativos da marca MSCHF desfez carteiras Birkins verdadeiras para criar as Birkinstock.

Para quem não está familiarizado com os MSCHF, eles já são considerados o Banksy da cultura de consumo, com ações de guerrilha contra empresas que diabolizam (como a Amazon e o Facebook) e a destruição de produtos caros para criarem coisas novas (como os Nike com água benta na sola), que depois põem à venda. Agora, a ‘destruição criativa’ do coletivo, acrónimo de ‘miscellaneuous mischief’ (miscelânea de traquinagens), vai para outro patamar. Quatro Birkins verdadeiras em segunda mão (mais umas quantas falsas para criarem o protótipo) – nas quais os MSCHF gastam 122.500 dólares (€101.551), segundo o ‘New York Times’, são estraçalhadas para darem origem às tiras cosidas sobre as solas Birkenstock, igualmente verdadeiras. A apropriação indevida destas marcas é uma questão que ainda não foi levantada por nenhuma das partes, mas certamente dará origem a processos judiciais.

O rapper Future é um dos compradores divulgados, bem como a cantora Kehlani e um colecionador de arte anónimo.

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A escolha da Birkin é justificada por ser um símbolo de estatuto que, ao ser destruído e transformado em algo acessível, força as pessoas a questionar o simbolismo dos objetos. Passando da teoria ideológica à prática, as Birkinstock são tudo menos acessíveis. Cada par custa entre 35 mil dólares (€29 mil) e 76 mil dólares (€63 mil) - dependendo do tamanho - e é feito por encomenda até a matéria-prima estar esgotada. O preço e a excentricidade criativa justificam o perfil de alguns dos primeiros compradores já divulgados, como o rapper Future, a cantora Kehlani e um colecionador de arte anónimo. Kylie Jenner tem mais sorte (ou visibilidade planetária) e as Birkinstock foram-lhe oferecidas, apanhando boleia da notoriedade nas redes sociais de uma das irmãs Kardashian. Contas feitas, o espírito anti-sistema deste projeto acaba por beneficiar do próprio sistema, com os seus criadores a revelarem-se exímios no marketing e na comunicação.

Kyle Jenner tem mais sorte (ou visibilidade planetária) e as Birkinstock foram-lhe oferecidas.

Não é por acaso que os MSCHF, mais do que um coletivo artístico, são a marca do momento nas redes sociais, seguindo uma estratégia de apresentação de um novo produto disruptivo, duas segundas-feiras por mês. É fazendo este caminho que elevam agora a fasquia da Birkenstock, mesmo sem a marca alemã se dar como participante na criação. Ainda não está claro, no entanto, se este lançamento poderá ser uma ‘traquinice’ para valorizar a marca alemã, num espírito semelhante ao que levou à subida das ações em Bolsa da GameStop. Na mesma semana em que as Birkinstock são reveladas ao mundo, a Birkenstock deixa ‘transpirar’ a notícia que está a negociar a venda ao L Catterton, fundo de investimento que conta com a participação do LVMH e da própria holding familiar de Bernard Arnault, líder e acionista daquele que é o maior grupo de luxo do mundo.

A apropriação indevida de artigos e a ‘colagem’ a símbolos da Birkenstock e da Hermès certamente darão origem a processos judiciais.

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Segundo a Bloomberg, a Birkenstock aponta para uma avaliação da empresa entre €4 mil milhões e €4,5 mil milhões, incluindo a dívida. A L Catterton ainda se encontra em processo de condução dos procedimentos necessários para fechar a proposta, que poderá ser subida face ao ‘fénomeno Birkinstock’. É que associação das sandálias ortopédicas ao coletivo que tem um forte apelo junto dos jovens garante a aproximação a este segmento etário, que é o que mais faz crescer o consumo de luxo. Até à data nenhuma das partes se pronunciou sobre as alegadas negociações e a transação é incerta, estando previsto para os próximos meses um eventual desfecho. Caso a venda se concretize, isso significa a abertura de horizontes para a marca que começa há 247 anos com Johann Birkenstock, um sapateiro de Langen-Bergheim, na Alemanha.

O ponto de partida para o calçado ortopédico acontece com um dos seus descendentes, Konrad Birkenstock, que cria e comercializa as primeiras palmilhas flexíveis, em 1896. A invenção das palmilhas com o molde do pé e espaços para os dedos, que caracterizam as Birkenstock, essa, só se dá em 1930 e decorre de estudos e testes até chegar a um formato que melhor respeite a anatomia e o conforto. O resultado são umas palmilhas forradas a camurça, com espuma de amortecimento, camadas de cortiça, juta e látex, colocadas sobre uma sola de borracha. É a partir desta invenção que a Birkenstock faz a história do calçado ortopédico, vendendo cerca de 24 milhões de pares, em 2019. Dois anos antes já tinha aplicado o conhecimento técnico na criação de uma linha de camas, estrados e colchões, igualmente ortopédicos. Resta saber se os turistas ingleses não irão questionar a derivação luxuosa de um símbolo de conforto despretensioso.”

Catarina Nunes

Jornalista

Garantimos-lhe uma coisa:

Se umas Birkenstock o magoam, é apenas porque comprou o número errado.

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