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O Barbeiro de Cedilha

A barba na óptica do utilizador

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SOS

na óptica do utilizador, 19.07.24

Declaração de interesses - Falo com a preocupação de quem convive de muito perto com o assunto.

Actualização a 26/07/2024

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Ao contrário do que nos é dito (ou não dito, pois parte da comunicação social mantém um silêncio muito pouco dignificante e até suspeito), o SNS está a colapsar a cada dia que passa.

No último dia do ano de 2023 foi dado fim às Administrações Regionais de Saúde e aos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) que a elas pertenciam. No dia 01 de janeiro de 2024 entraram em funções as 39 Unidades Locais de Saúde (ULS) que absorveram os Cuidados de Saúde Primários unindo-os aos Hospitalares, sem dó nem piedade e sem se ter em consideração as especificidades de cada um destes serviços.  

O caos administrativo que daí resultou foi responsável por um clima de insegurança, de receio e de perplexidade, que atingiu sobretudo os médicos de família (Medicina Geral e Familiar) e as equipas de gestão dos ACES engolidos pelas ULS.

Os utentes não se apercebem desta mudança súbita e radical que foi executada literalmente de um dia para o outro, sem o necessário e moroso plano de fusão, mas os profissionais conhecem os problemas que se acrescentaram aos existentes, muitas vezes exponenciando as dificuldades e desordens nas organizações fundidas, quase imobilizando a máquina administrativa e aumentando a carrada de burocracia. O desconhecimento mútuo dos procedimentos administrativos, das especificidades de cada serviço e mesmo as características dos cuidados de saúde prestados pelos diferentes organismos, originou perigosas confusões, inseguranças, gastos inúteis de tempo e dinheiro e sobretudo o desgaste da saúde mental dos profissionais.    

O problema foi (porque podia ser) disfarçado e com a cumplicidade da maior parte da comunicação social, não foi dada notícia do que ocorria, nada aconteceu, exatamente como se desapareceu o caos nas urgências que parece ter sido extinto com um passe de mágica.

Para agravar a situação, a nova ministra da Saúde decidi de repente alterar a forma de funcionamento do concurso para colocação dos novos especialistas. Até à data o concurso era centralizado, sendo o resultado consequência da nota do internato da especialidade médica. O médico recém-especialista com a classificação mais alta tinha a possibilidade de escolher um leque de Unidades onde desejava exercer funções. Sabia de antemão e com bastante certeza onde seria o seu local de trabalho.

Nos anos de 2022/2023 este concurso decorreu sem percalços e com o sucesso esperado.

No ano de 2024 são as ULS a abrir os seus próprios concursos. Às pingas, e algumas não indicando os locais onde as vagas existem. Tendo em consideração que a área geográfica abrangida por uma ULS pode ser imensa, o novo especialista concorre às cegas, podendo, sem ter voto na matéria, ser enfiado e esquecido seja onde for. A nota do internato deixou de ter relevância e tanto faz ter obtido dez como vinte valores. A sorte é macaca e a cunha potente.

Acresce referir que os concursos estão a abrir tarde e a más horas e aos pedaços. Ou seja, os prazos estipulados pelo ministério foram caducando sucessivamente e neste momento as ULS que publicam os procedimentos “concursais” fazem-no quando decidem, com regras que apenas se coadunam às especialidades hospitalares cujos profissionais conseguem perceber em que Hospital são colocados (um jovem cirurgião, por exemplo, concorre para determinado hospital onde sabe que existe vaga e é nesse hospital que encontra o seu posto de trabalho). Os jovens médicos especialistas em Medicina Geral e Familiar perdem-se completamente no sistema, porque também desconhecem onde existem as vagas em certas áreas onde pretendiam ser colocado.

É curioso verificar que dois dos critérios de selecção do recém-especialista, escolhidos por uma ULS do Alentejo, demostram entre outras coisas que quem os elaborou está isolado na montanha da imbecilidade há demasiado tempo. Ter um doutoramento e seis anos de experiência são critérios que contribuem certamente para a desertificação do concurso e da região. São recém- especialistas o público-alvo, pelo amor da santa!

É ainda escandaloso que todos os jovens especialistas, seja em que área for, tenham de ser sujeitos a entrevistas de selecção (que vão ocupar no mínimo três médicos que deixam de atender utentes durante um tempo que tem de ser longo e penoso e que depende do número de candidatos que se apresentarem pela frente) e que se torna idiota tendo em conta que os profissionais passaram por variadas avaliações ao longo do percurso, sendo que a última decorreu há poucos meses.

É ainda relevante o facto de “entre o vai e o racha”, o “pingar” dos concursos e as manobras de diversão que os arrastam, se corre o risco dos primeiros resultados surgirem em Outubro, o que vai colidir com o fim da segunda época dos internatos de especialidade.

Entretanto os sistemas de saúde privados crescem como cogumelos e aguardam (e fomentam?) as várias centenas de recém-especialistas que deixarão o SNS para os contratar ao preço da chuva.  

Esta miséria é ainda pouco conhecida, assim como tem passado despercebida a ilusória “diminuição “ da lista de pessoas sem médico de família que resulta de “apagões” ministeriais e de procedimentos administrativos que desactivam inscrições, embora já se comece a denunciar aquie ali, mas a dimensão da porcaria é muito maior do que o relatado e faz com que sem contar nos surja na frente o nosso recém-especialista a procurar vagas em Medicina Geral e Familiar na Dinamarca.     

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