autorretratos - in memoriam - Erwin Olaf (1959-2023)
O fotógrafo holandês Erwin Olaf morreu no dia 20 de Setembro deste ano, na cidade de Groningen.
Tinha 64 anos e sofria de enfisema pulmonar, detectado em 1996, não tendo resistido às complicações decorrentes da transplantação de um pulmão, realizada semanas antes.
Erwin Olaf é um artista internacional que Taco Dibbits, diretor do Rijksmuseum, classifica como “um dos fotógrafos mais importantes do último quartel do século XX”, detentor do International Color Awards e eleito Artista Holandês do Ano pela revista Kunstbeeld e com cerca de 500 obras adicionadas ao acervo da coleção do Rijksmuseum.
Nas derradeiras imagens de Olaf num acto público, vemo-lo com um sistema de inaladores para auxiliar a respiração. Foram obtidas em Março deste ano, no Palácio Noordeinde, em Haia, na cerimónia em que o Rei Willem-Alexander o condecorou com a Medalha de Honra das Artes e Ciências da Ordem da Casa de Orange. Aliás, em 2013, Olaf concebera o design de uma moeda de um euro com a imagem do rei, tendo também assinado, em 2018, um notável portfolio de retratos oficiais da família real holandesa.
Esta dimensão oficial do trabalho de Olaf talvez tenha contribuído para uma menor atenção às singularidades do seu universo fotográfico, incluindo os breves complementos filmados que ia registando, como aconteceu nas séries Separation (2003) ou Shangai (2017). Para além disto, Olaf foi rotulado como artista "militante", activista dos direitos LGBT, diluindo-se na "mensagem" a precisão com que nela encontramos uma questão fulcral da iconografia contemporânea.
A obra altamente diversificada gira em torno dos indivíduos marginalizados da sociedade, incluindo mulheres, pessoas de cor e a comunidade LGBTQ+, mas é paradigmático o seu tríptico de monumentais quadros fotográficos e cinematográficos retratando períodos de mudanças sísmicas nas principais cidades do mundo e os cidadãos abraçados e diferenciados pelo seu progresso urbano. Grande parte do seu trabalho é contextualizado pelas complexas relações raciais, pela devastação das divisões económicas e pelas complicações da sexualidade.
Olaf não é um "purista" da imagem e nunca renegou as potencialidades criativas da manipulação (as distorções dos rostos na série Le Dernier Cri (2006), com destaque para o retrato de uma modelo, quase sósia da Princesa Diana, em "Royal Blood", de 2000, são exemplos disso) e a radical solidão dos fotografados, retratos teatrais e encenados, que tantas vezes remetem para Lucien Freud, sobretudo nos nus da série Skin Deep (2015).
Talvez os retratos de Olaf não sejam estranhos à uma herança multifacetada da pintura holandesa. Tal como aí, os os humanos retratados e os cenários em que se retratam existe uma espécie de tolerância e alheamento, tornando as personagens livres, mesmo até livres dos cenários.
“Para Olaf, tanto na contenção destas poses como na contundência dos nus, a fotografia existe, em última análise, como mensageira de um valor cada vez menos respeitado nas nossas sociedades viciadas em "comunicação". É um valor que se diz através de uma palavra ancestral: pudor.” Diz-nos ainda Taco Dibbits.
Erwin Olaf expôs em todo o mundo, incluindo no Centro de Arte Contemporáneo de Málaga, Málaga, Espanha; no Museu da Imagem e do Som, São Paulo, Brasil; no Martin-Gropius-Bau, Berlim, Alemanha; no Centro Sudeste de Arte Contemporânea, no Winston-Salem, Carolina do Norte, EUA e no Museu de Arte Contemporânea, Santiago do Chile. Na primavera de 2019, o trabalho de Olaf foi objecto de uma exposição dupla no Kunstmuseum de Haia e no Museu de Fotografia de Haia, de uma exposição individual no Centro de Fotografia de Xangai e de uma exposição no Rijkmuseum de Amsterdão. Em 2021, teve exposições individuais na Kunsthalle München, Alemanha e no Museu de Arte de Suwon, Suwon, Coreia.
O trabalho de Olaf está incluído em inúmeras colecções públicas e privadas, como o Rijksmuseum e o Museu Stedelijk, ambos em Amsterdão, Holanda; Fonds National d’Art Contemporain, Paris, França; Museu Ludwig, Colônia, Alemanha; Museum Voorlinden, Wassenaar, Holanda, Museu de Arte da Carolina do Norte, Raleigh, Estados Unidos; Colecção Art Progressive, Estados Unidos e Museu Pushkin, Moscovo, Rússia.